“O maior inimigo da verdade é frequentemente não a mentira – deliberada, planejada, desonesta – mas sim o mito – persistente, entranhado e irreal”. (John F. Kennedy)
A minissérie The Kennedys, produzida pelo canal History Channel, tinha por pretensão mostrar de forma fiel a família americana mais importante do século XX. Rodeada por polêmicas de todos os tipos, ela chegou a ter sua exibição cancelada nos EUA (em parte por pressão dos membros da família), até ser resgatada pelo canal a cabo Reelz. O que todos gostariam de saber mesmo é se tanto alvoroço faz jus a esta produção. A minha resposta para esta questão está expressa nesse texto.
Historicamente, os Kennedys conseguiram o feito de se tornar o que mais próximo poderíamos chamar de uma verdadeira aristocracia americana. Marcada por inúmeras controvérsias, a família sempre exibiu um ar de superioridade, juventude e determinação, que tão bem casava com o imaginário americano de uma linhagem real. De fato, a grande conquista, intencional ou não, foi mesclar a mitologia e a realidade de tal maneira, que até hoje muito que é dado como verdade não passa de produto de uma propaganda eficaz que perdurou durante décadas.
Posto isto, a atitude de tentar desmistificar a tão cultuada família já é, por si só, elogiável. O trabalho da produção merece também elogios, envolvendo desde a caracterização dos personagens até o trabalho realizado pelo elenco, que conta, em geral, com atores competentes.
A primeira grande quebra de mito que a minissérie promove é de traçar a personalidade “difícil” do patriarca da família, Joseph P. Kennedy. Sendo magistralmente interpretado por Tom Wilkinson, “Joe” é exibido como um homem rico, ambicioso, dotado de ranços racistas e manipulador hábil. Na verdade, a idéia que a produção vende logo em seu episódio inicial é que foi justamente a sua frustrada tentativa de se tornar presidente, sucedendo assim a Franklin Roosevelt, que o levou a transmitir de forma inconseqüentemente seu sonho aos seus filhos, em especial a Joseph, John e Robert.
Por sua vez, os filhos de Joseph também passaram por um processo de desmistificação mais sutil que o pai. No entanto, tal atitude é compreensiva se tivermos em vista qual foi o objetivo desse primeiro episódio. Mesmo começando sua narrativa em plena eleição de 1960 para presidente, JFK não passa de um figurante na história inicial. Outro que também não tem grande importância nesse começo é Robert Kennedy (Barry Pepper), que atua como coordenador da campanha do irmão. Quem rouba todas as cenas é mesmo o pai dos dois e as escolhas que ele tomou ao longo da vida que terminaram por culminar naquele momento em especial.
Sobre John F. Kennedy, ou o “Kennedy que realmente importa”, fica claro que o futuro presidente era uma pessoa dividida entre as responsabilidades perante sua família e seus desejos obscuros, entre eles sua obsessão por sexo, algo que só foi dado a entender levemente nessa 1ª parte. A impressão que propositalmente (ao menos foi o que deu a entender) é que ele era alguém facilmente manipulável, frívolo e despretensioso. Foram críticas indiretas realmente pesadas ao mito que JFK tornou-se para os americanos.
Um recurso muito bem usado pela produção foi os flashbacks, que começaram no final da década de 30, onde Joseph P. Kennedy tinha o cargo de embaixador americano na Inglaterra e tentava evitar a todo custo que os EUA fossem a guerra contra Hitler; passando pela 2ª Guerra Mundial (1939-1945), período no qual o primogênito do clã, Joseph Jr, morreu em batalha; até o final dela, onde John F. Kennedy (Greg Kinnear) “herda” do irmão o dever de se tornar presidente.
A produção, desenvolvida por Joel Surnow (showrunner da série 24), foi rejeitada oficialmente pelo History Channel por não respeitar fatos históricos. Como eu já sabia disso antes de conferir o episódio inicial, fiquei bastante atento quanto a essa questão. Estranhamente, não consegui ver os tais erros cronológicos nem na narrativa nem na edição, o que só reforça a teoria do boicote por motivos meramente políticos. Azar deles, já que a produção conseguiu bater o recorde de audiência do canal Reelz, fazendo 1,9 milhões de espectadores em seu episódio inicial. Lembrando que falta ainda a exibição dos sete episódios restantes da minissérie.
A grande ironia que fica escancarada nesse primeiro episódio fica mesmo pela idéia de que um dos presidentes mais importantes dos EUA no século passado não queria ser presidente. Que outras surpresas a minissérie guarda para o seu público é algo que estou curioso para descobrir.
P.S: Nem nos próprios sonhos da Katie Holmes ela conseguiria ser a primeira-dama Jackie Kennedy. A presença nessa minissérie da “mulher do Tom Cruise” só se justifica por seu nome ainda ter certa relevância no mercado nacional, por quem em atuação não é ganho algum.
Confira o trailer:
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